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Polarização e diálogo

Já muitos salientaram o facto de o ano de 2024 se caracterizar por nele ocorrer um grande número de eleições políticas. Calcula-se que se realizarão este ano eleições em 64 países e que essas eleições envolverão cerca de metade da população mundial. Também em Portugal já se realizaram, ou realizar-se-ão, eleições nacionais, regionais e europeias. 

Um fenómeno que, a este respeito, se vem generalizando cada vez mais em muitos países, é o da polarização política, isto é, da tendência para a divisão profunda em blocos contrapostos cujos adeptos parecem divergir em quase todas as matérias. Isso nota-se em países como a Argentina, o Brasil, os Estados Unidos, mas também a Espanha, a Itália ou a Polónia. Em Portugal a tendência não será tão acentuada, mas também poderemos caminhar nessa direção.

Essa polarização conduz a divisões nas famílias e a quebras de relações de amizade. Para não chegar a esse ponto, há quem, pura e simplesmente, evite falar de política. É que a divisão que se cria não é apenas entre quem tem ideias divergentes, mas entre quem considera que os “bons” estão todos do seu lado e os “maus” do outro e que quem não está comigo e connosco está contra mim e contra nós.  

Levada a estes extremos, a polarização origina fraturas sociais particularmente nefastas.

Chiara Lubich e o Movimento dos Focolares, por ela fundado, sempre apontaram para a unidade como objetivo da sua ação, a unidade pedida por Jesus ao Pai (“Que todos sejam um, como Tu e Eu somos um” – Jo 17, 21). E como instrumento para a realizar, de diferentes formas, apontaram o caminho do diálogo: entre católicos, entre cristãos de diferentes denominações, entre fiéis de várias religiões, entre crentes e não crentes. Desse Movimento nasceu o Movimento Político para a Unidade, que junta políticos de diferentes tendências.

O diálogo é, na verdade, o verdadeiro antídoto contra a polarização. Parte do pressuposto de que o outro, meu interlocutor, é para mim uma riqueza, também no que de mim o distingue, na sua diferença. Dizia Chiara Lubich que «todos são candidatos à unidade». Uma postura dialogante leva a descobrir e salientar aquilo que nos une, mais do que aquilo que nos separa. Isso só pode trazer benefícios na vida política, muitas vezes marcada por divisões artificiais, onde o acentuar das diferenças faz esquecer os consensos que representam o cimento de uma sã e frutuosa convivência social.

Essa postura dialogante também permite completar e enriquecer uma minha visão limitada da realidade. Muitas vezes (nem sempre, é certo, pois nem tudo é relativo), estão em causa duas perspetivas de uma mesma realidade e esta conhece-se melhor quando se juntam as duas perspetivas, quando ela é vista de mais de um ângulo.

Para além das divergências e consensos, o diálogo é frutuoso quando parte da consciência da fraternidade, a consciência de que o interlocutor é um irmão ou irmã que, para além do que possa pensar, poderá ter as melhores intenções e a melhor boa-fé.

É esta arte do diálogo que deve ser aprendida, por políticos e por cidadãos, para evitar os perigos e malefícios da polarização.

> Artigo publicado no editorial da Revista Cidade Nova  de março de 2024