Igreja Una
- Pedro Vaz Patto
- 15 Agosto, 2023
- 0 ponto de vista de Cidade Nova
- Opinião
Permanecerá para sempre na memória de muitos a imagem de unidade e universalidade da Igreja que tivemos ocasião de contemplar na Jornada Mundial da Juventude. Peregrinos de todos os cantos da Terra, até dos países mais pobres e longínquos, compuseram uma festa de alegria e esperança que comoveu crentes e não crentes. E também permanecerá para sempre o eco do apelo do Papa Francisco a uma Igreja onde cabem todos, porque Deus chama cada um pelo nome e dele quer fazer «uma obra prima única, original».
Quando para elas se iluminou de modo particularmente intenso a página do Evangelho em que Jesus pede ao Pai «que todos sejam um como Eu e Tu somos um» (Jo, 17, 21), Chiara Lubich e as suas primeiras companheiras compreenderam e sentiram que para isso tinham nascido, para realizar essa vontade de Deus. E foi isso que procurou, e procura, fazer, o Movimento dos Focolares, por ela fundado.
A aspiração à unidade pedida por Jesus levou Chiara e os Focolares a percorrer as estradas do diálogo, antes de mais no interior da Igreja Católica, depois com cristãos de outras denominações, depois também com fiéis de outras religiões, com pessoas de convicções não religiosas e com a cultura contemporânea.
Nesse primeiro âmbito, da Igreja Católico, há a destacar iniciativas que partiram do histórico encontro da festa de Pentecostes de 1998, quando Chiara, diante de São João Paulo II se comprometeu, em nome dos Focolares, afirmando: «..sendo nosso carisma específico o da unidade, empenhar-nos-emos com todas as nossas forças em contribuir para realizar plenamente a comunhão entre os movimentos».
Vem bem a propósito a recordação desse encontro de Pentecostes de há vinte e cinco anos, neste preciso momento da vida da Igreja Católica, em que se aproxima uma importante etapa do Caminho Sinodal que ela vem percorrendo com uma alargada e inédita participação de fiéis leigos de todo o mundo. Participação, comunhão e missão são as três palavras que sintetizam os objetivos deste Caminho Sinodal.
E também vem a propósito ligar essa festa do Espírito Santo e a unidade da Igreja, que então se testemunhou através da unidade entre movimentos eclesiais, com o Caminho Sinodal. O desafio deste Caminho não pode deixar de ser o do reforço da unidade da Igreja, não o do acentuar das tensões que a dividem. Para que assim seja, há que deixar que seja o Espírito Santo a atuar como verdadeiro protagonista, evitando a luta de frações com agendas pré-determinadas.
Isso mesmo tem salientado o Papa Francisco. Precisamente na festa de Pentecostes deste ano, ele afirmou: «o Sínodo em curso é – e deve ser – um caminho segundo o Espírito: não um parlamento para reclamar direitos e exigências à maneira das agendas de trabalho no mundo, nem ocasião de se deixar levar ao sabor de qualquer vento». Salientou, também, que o Espírito gera a unidade e a harmonia a partir da pluralidade de dons: «o Espírito, como sucedeu na Criação, gosta de criar harmonia precisamente a partir da pluralidade. A sua harmonia não é uma ordem imposta e aprovada. Não! Na Igreja, há uma ordem “organizada segundo a diversidade dos dons do Espírito” (S. Basílio, Spir., XVI, 39)».
Para que o Caminho Sinodal conduza a uma Igreja mais unida, e não mais fraturada, há que fomentar a escuta recíproca, o desapego em relação a visões pessoais e de grupo e a fidelidade ao património doutrinal comum.
Pode servir-nos de exemplo o do acontecimento mais marcante das últimas décadas da história da Igreja, o Concílio Vaticano II, onde, apesar da presença de muitas e distintas visões à partida e durantes os debates, se alcançaram largos consensos em documentos aprovados quase por unanimidade. Foi certamente a ação do Espírito que a isso conduziu.Convém também recordar, a este respeito, as palavras de São João XXIII no relevante discurso (intitulado Gaudet Mater Ecclesiae) de abertura desse Concílio. Aí ele sublinhou que o objetivo era que «a doutrina certa e imutável, que deve ser fielmente respeitada, seja aprofundada e exposta de forma a responder às exigências do nosso tempo». Na fidelidade a esse “depósito da fé”, a Igreja, «deseja mostrar-se mãe amorosa de todos, benigna, paciente, cheia de misericórdia e bondade também com os filhos dela separados».
> Artigo publicado no editorial da Revista Cidade Nova de agosto/setembro de 2023
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